julho 03, 2003

BERLUSCONI. O primeiro-ministro italiano começou hoje a presidência italiana à sua maneira: como um personagem burlesco: dirigindo-se a um eurodeputado, disse o seguinte: «Senhor Schulz, eu sei que há em Itália um produtor que está a filmar sobre campos de concentração nazi. Eu gostava de lhe sugerir o papel de “Kapo”. Seria perfeito.» Berlusconi tem atrás de si várias coisas que o não recomendam: o poder excessivo que detém sobre os média italianos, o rasto de contas mal feitas com a justiça e a ética, uma enorme quantidade de manigâncias e de negócios obscuros. A sua figura é a de um personagem burlesco, muito à maneira do cinema italiano. Enfim, poucas coisas o recomendam. Não sei o que lhe disse o outro eurodeputado, mas a utilização da figura do «kapo», juntamente com a evocação dos campos de concentração – e com o sorriso de Berlusconi –, traduz uma banalização do mal e do horror que é ainda mais burlesca do que esse sorriso. Como se fosse uma anedota. Uma piada que se diz a meio de uma passeata por Estrasburgo, antes de regressar a Roma. Uma graçola. Essa banalização é perigosa, tanto quanto a dos que evocam Goebbels ou Hitler a propósito de tudo e de nada. O delírio começou durante a guerra do Afeganistão, quando Bush começou a ser comparado a Hitler e o exército americano às divisões nazis. Essas comparações são quase sempre obscenas e revelam a má-fé dos beligerantes, mais do que a sua falta de imaginação ou a miséria da sua memória. Os palhaços, quando – à esquerda e à direita – escolhem o tom épico ou as metáforas fáceis, são perigosos. Mas era suposto isto não acontecer em Estrasburgo, penso eu.

O governo italiano, de resto, convocou o embaixador alemão – para lhe explicar que Berlusconi é um incontinente, um figurão.