outubro 11, 2003

NOTAS SOBRE ULYSSES, 3. Molly Bloom. O caso é, aparentemente, mais grave ou, pelo menos, mais difícil de esclarecer nestes termos de «isto lembrou-lhe aquilo». Comecemos por Nora Barnacle, depois — e definitivamente — Nora Joyce: Richard Ellmann diz que Nora era anti-intelectual. Que importância tem isso? Parece que James Joyce a amou durante toda a vida («I would go anywhere in the world if I could be alone with your dear self without family and without friends», vem nas Letters) — Joyce dividiu o seu amor familiar entre Nora e os filhos de uma forma estranha. Lucia foi a sua preocupação de sempre (é engraçado como os biógrafos atribuem a Nora a crescente loucura de Lucia). Mas vejamos as fotografias, sobretudo as de Berenice Abott — uma fotógrafa que trabalhou com Man Ray: a compostura de Nora é determinada pelo olhar, é a única (entre as que Berenice fez de Nora, Lucia e James) que olha para a objectiva (vejam-se os retratos de Tullio Silvestri, de Trieste, o de Frank Budgen, em Zurique, ou o de Myron Nutting, em Paris); Lucia, fotografada de perfil, em plano americano, é belíssima, e olha em frente — portanto, não para a objectiva, que está à sua esquerda, mas para a frente, sentada com uma mão no regaço e a outra assente sobre o braço da cadeira; Joyce, James Joyce, de camisa às riscas e de fato claro, com um laço apropriado, apoia-se sobre o cotovelo, nas costas do sofá, levando a mão à testa. Aparentemente, tudo leva a crer, são completamente diferentes um do outro: James introvertido, ausente — Nora, decidida, pouco dada a melancolias. Joyce dizia dela, numa carta a Stanislaus: «Adorably ignorant.» Mas isso não o assustava muito — assustava-o mais a enumeração dos antigos namorados de Nora, por exemplo.