outubro 11, 2003

NOTAS SOBRE ULYSSES, 5. Estamos em Dublin, no verão de 1904, 16 de Junho, em Merrion Square. Vão os dois (Joyce e a então Nora Barnacle) para longe do centro da cidade, para a zona do porto, perto de Dun Laoghaire, Ringsend. Ellmann diz que ambos se tocaram nessa noite. Brenda Maddox é mais crua: «To Joyce’s greatful astonishment, she unbuttoned his trousers, slipped in her hand, pushed his shirt aside and, acting with some skill (according to his later account), made him a man.» Digamos que Joyce não estava preparado. Maddox esclarece, jovial: James pensou que uma rapariga não faria isso se, antes, não tivesse já uma larga experiência na matéria. Mais tarde, numa carta de 1909, Joyce pergunta a Nora se ela «felt a man’s or a boy’s prick in your fingers until you unbuttoned me?» Pobre Jimmy. Ringsend não era, propriamente, um lugar de conversas sobre literatura, embora não fosse a Nassau Street de então, onde as prostitutas faziam o seu negócio. E Nora não era, também, uma rapariga inocente — atrás de si vinha uma história curiosa, a de, em Galway (onde nascera e de onde chegara há pouco tempo), ter vivido (sem ser casada) com um homem a quem era atribuída a autoria de um livro pornográfico, sem falar das necessidades de dinheiro. Mas Joyce também era um artista nessa matéria: sabia como viver à custa dos outros, e, se Nora pensava em obter dele algum dinheiro, estava redondamente enganada. Brenda Maddox lança uma pilhéria: era mais plausível que fosse ele a pedir-lhe dinheiro.
Mas o tempo passou, como passa invariavelmente, e estes episódios ficam esquecidos ou, pelo menos, vão perdendo a importância que poderiam ter quando Joyce e Nora se encontravam nesse Verão de 1904, ou quando trocavam cartas rápidas, breves, cheias de pecado e de convites para outros e novos encontros. Stephen Dedalus falará disso em Ulysses, quando passeia para lá de Ringsend Park e sente o cascalho sob os pés: «Toca-me. Suaves Olhos. Suave, suave mão. Sinto-me tão só, aqui. Oh, toca-me depressa, agora. Que palavra é essa que todos os homens conhecem? Eu aqui estou sozinho, quieto. E triste, também. Toca-me, toca-me.» O que é certo é que a fama de Nora como mulher iletrada (tinha apenas a grammar school) e indiferente aos livros de Joyce, faz parte, apenas, da lenda literária do seu marido. Na vida de Joyce, ela será sempre mais poderosa do que se julga.