outubro 14, 2003

UMA ONDA DE PARVOÍCE, 9. Acho que alguns dos contributos desta discussão poderão ser enviados ao Ministro da Educação — como sinal de uma preocupação e como claro protesto a propósito da questão dos manuais escolares. Sinal de que a «blogosfera» se preocupa. Leia-se, por exemplo, o contributo de Pedro Freitas (professor universitário, do departamento de Matemática da Faculdade de Ciências de Lisboa) que se junta à discussão sobre a «onda de parvoíce», e escreve sobre o assunto, por mail:

«Orientei estágios de alunas que viriam a dar aulas no secundário. Nessa altura dei-me conta que, atrás do problema da falta de exactidão dos manuais (cheguei a ver um em que as definições das funções trigonométricas tangente e cotangente estavam trocadas), há um uma fúria de tornar as coisas mais próximas dos alunos, num "ensino centrado no aluno", como se ouve muito, por vezes em deterimento dos conteúdos. Ora, eu não sou contra a atenção pedagógica necessária, ao aluno como pessoa, e à sua situação social e psicológica — há uns anos usavam-se manuais de matemática no liceu que, digo-o com segurança, ninguém percebia (pelo menos em parte). Mas agora caiu-se no extremo oposto, julgo eu que devido a uma tendência pós-moderna exagerada, mal amadurecida e mal interpretada, que invadiu as escolas de educação. Os conteúdos são relativizados em relação aos métodos, e, na urgência de mudar, experimentar, nem há tempo para corrigir manuais. E, no limite, para algumas pessoas, nem há motivo sequer para preferir certos conteúdos a outros, nem mesmo o facto de os primeiros serem cientificamente verdade e outros não (veja-se a propósito Um Discurso Sobre as Ciências de Boaventura Sousa Santos).
Cito (de memória) uma frase do filme
Les Invasions Barbares, dita por um professor doente, acamado, rodeado de amigos, quando é visitado por uns alunos: "Sim, são analfabetos, mas se lhes tivessem ensinado como deve ser, seriam tão inteligentes como nós."»


Vítor Brinches, do The River Run e do do Leitura Partilhada sugere uma área específica de estudos dos média:
«Aproveito esta discussão para relembrar alguns factos essenciais: a) a maior parte dos alunos do secundário passa mais horas por semana em frente do écrã (seja da televisão, da consola, do computador ou da internet) do que à frente do livro ou do professor; b) Qualquer aluno quando acaba o secundário tem mais slogans publicitários na cabeça do que versos da poesia portuguesa.
Por que não aproveitar esta ocasião para discutir a criação de uma disciplina obrigatória de análise dos media (ou mídia, como preferirem), de educação para os media (e por que não incluir também noções básicas de cidadania e de direitos do consumidor, por exemplo). Uma disciplina que preparasse os alunos para discutir, para agir, para pensar sobre os media que afinal são omnipresentes na sua formação. Uma disciplina em que se discutisse as técnicas de propaganda utilizadas pelos partidos políticos nas campanhas eleitorais, as manipulações da publicidade, do marketing, da televisão e, por que não, o regulamento do Big Brother.»


Também Pedro Cruz Gomes (do Planeta-Reboque) envia um mail com uma pergunta — que, no entanto, enfrenta a lógica da economia de mercado:

«Porque é que não é o Ministério da Educação a publicar UM manual para cada disciplina? Poupava-nos quase todas as aberrações que vêm sido citadas (sobrava só a estupidez oficial, mas isso é outra história...) e poupava outros dois pesadelos actuais: o preço e o peso dos livros (papel couché de muita gramagem para quê?).»