dezembro 08, 2003

MANUAIS ESCOLARES. Há nesta notícia um pouco de tudo, mas acho que fica bem falar apenas da incredulidade — a Porto Editora vai substituir a página do seu manual de Português B, para o 10° ano, com a menção ao Big Brother, colocando em seu lugar outro concurso televisivo. Eles não percebem nada, há nesta gente um descaramento que não recua diante de nenhum absurdo. Retirando o Big Brother do manual, as consciências podem voltar para o armário e o debate fica interrompido; o novo concurso televisivo, «muito mais inócuo» — e da RTP — acalma as hostes, amaina a tempestade, lava a cara do ridículo. As coisas ficarão assim, porque «nem o Estado nem os editores podem fazer censura sobre os autores dos livros». Esta declaração, de «liberalismo» de pacotilha, só engana papalvos. O que está em causa, aqui, não são «os autores dos livros» — são «os autores dos livros escolares». Ora, quando se fala de «livros escolares» não falamos do novo romance de Rui Nunes nem do livro de José Mourinho: falamos da escola propriamente dita. E, portanto, nem sequer estão em causa os professores (longe disso), nem os autores dos livros escolares. Está em causa a «vastíssima sapiência» que tomou conta dos programas de ensino do Português e desistiu da inteligência, da literatura, do conhecimento, da cultura. Esse lado de Portugal, muito moderno há vinte anos, muito avançado há trinta, ressentido contra a cultura, formado com um altíssimo nível de clichés, pronto a repetir banalidades e erros históricos, a desculpar erros de ortografia e imprecisões de cronologia — esse lado de Portugal envergonha-nos.