julho 20, 2004

JUVENTUDE. Parece que uma das linhas de acção dos governos portugueses é, sempre, a da protecção à juventude. Parece-me um exagero e um abuso. Esta ideia de proteger a juventude é despropositada – não há nada mais protegido, nas sociedades actuais, do que a juventude. No caso português, então, a avalanche de jovens que enche os jornais, as televisões (onde qualquer pivot de notícias com mais de 45 anos parece um absurdo nacional, como se fosse um escândalo aparecer na pantalha um cavalheiro com ar sério e conhecimento do mundo), as ruas, os estádios, os casos de polícia, as claques dos partidos, desmente qualquer necessidade de protecção. Pelo contrário, os velhos merecem protecção. Uma sociedade é tanto mais civilizada quanto mais protegidos estão os seus velhos – das intempéries, das doenças, do abandono dos filhos, da falta de transporte, da falta de alegria. Numa das minhas primeiras viagens na Suécia fiquei espantado quando o revisor de um comboio pediu (com ar de ser uma ordem) a um rapaz que cedesse o seu lugar a uma senhora de idade. E o aspecto dos velhos comoveu-me. Nunca gostei muito de dizer «terceira idade» depois dessa viagem – lembrei-me dos velhos do meu país, escondidos nos fundos, esquecidos nos hospitais. Anos depois, quando o Instituto da Juventude pôs no ar uma série de anúncios de televisão, idiotas e estapafúrdios, sobre jovens «que não fumam», a irritação subiu de tom; num deles, uma «jovem» frequenta lojas de roupa, esplanadas, anda de metro, somos informados de que «gosta de moda» (que é isso?) – e não fuma.
Não; esta ideia da «protecção à juventude» parece-me coisa para mentecaptos. A juventude precisa de gramática, de boas maneiras, de exercício físico, de leitura, de levantar cedo e de liberdade. E precisa de uma escola que não a trate como indigente ou diminuída intelectualmente. Os velhos, sim, precisam de apoio. Eles não são um mercado potencial, como os «jovens»; por isso mesmo os «jovens» não precisam de ministérios, protecção estatal e choraminguice. Mas os velhos sim, precisam de ser bem tratados. Precisam de ser ouvidos e de serem lembrados, de uma vida feliz e, também, de uma morte feliz.
Subjacente, existe outra ideia: a de que os velhos não têm nada para ser valorizado a não ser participar no «Praça da Alegria» e aparecer esporadicamente nos telejornais como vítimas de maus tratos em lugares miseráveis. Este contentamento do país que festeja com alarvidade os seus jovens escritores, jovens pintores, jovens «jotas, jovens estrelas de televisão, jovens vândalos, jovens idiotas e jovens analfabetos só nos devia envergonhar enquanto os velhos não forem, sequer, mencionados.