agosto 06, 2004

O FILME DE MOORE. COM DESCULPAS AO RUI. O Rui Miguel Curado Silva (um dos meus académicos de eleição, um dos animadores do Klepsidra) enviou um mail sobre a nota que aqui deixei a propósito do Farenheit 9/11, de Moore. Infelizmente, azares vários fizeram com que lhe perdesse o rasto (ao mail) durante alguns dias -- aqui está agora.
«As duas linhas que dedicou ao novo filme de Moore entraram numa cadeia de copy-paste do link do texto em que Kopel aponta 59 falsidades ao filme de Moore, e o pior é que me parece que ninguém leu esse texto e ninguém viu o filme. Eu vi o filme e quando comecei a ler o texto de Kopel estava convencido que ia ali encontrar a denúncia de maroscas do Moore (o que não me espantaria). Comecei a ler e desatei a rir. Aquilo é fraquito. A falsidade que me deu mais vontade de rir é o facto de ser falsidade Moore dizer que Flint é a sua home town (apesar de ter de facto vivido em Flint). Mesmo que as 59 falsidades de Kopel fossem todas verdade (eu verifiquei que algumas estavam erradas, outras são juízos de valor subjectivos, outras ainda demonstram que Kopel não percebeu certas partes do filme) nenhuma delas chega aos calcanhares de falsidades e de situações graves que Moore aponta à administração Bush e que nem o próprio Kopel desmente: a ligação da família Bush à família saudita, as relações entre o antigo regime de Saddam e Reagan, as relações recentes entre os talibãs e empresas texanas ligadas a Cheeney e a grupos económicos da família Bush, etc. O filme é falível, como todos os filmes, como os nossos blogues, como todos os livros que se tem escrito sobre o assunto. Estamos a falar de um filme e não de um documento oficial que deve ser rigoroso como: uma constituição, um texto jurídico, um artigo científico ou um relatório sobre armas de destruição em massa. O que eu acho estranho é que se seja tão rigoroso com Moore e se seja tão complacente com falsidades bem mais graves escritas em documentos oficiais, esses sim que não deveriam cometer erros nem falsidades, como os relatórios sobre armas de destruição em massa emitidos pela administração Bush. Aqui recomendo a leitura do último livro de Hans Blix (Irak: les armes introuvables) onde são apontadas muito mais do que 59 falsidades à administração Bush só no capítulo das armas de destruição em massa. Acho estranho todo este súbito rigor em relação a Moore (que produz um filme intencionalmente de espectáculo) num país que transmite astrólogas todos os dias na estatal RTP, que tem um primeiro-ministro que vai à bruxa, que tem nas páginas brancas um numero de serviço de horóscopo ao lado do número do despertar e da meteorologia e dos números de emergências, cujos jornais sérios dedicam às vezes 5 a 6 páginas de treta astrológica nas suas revistas de fim de semana, etc. Li as criticas ao filme de Moore noutros países onde o estilo de Moore é avaliado com a ponderação correcta: boa denúncia com uma dose de macacada. Ou seja, fazer rir para não chorar com assuntos graves. Só aqui em Portugal é que se é muito sisudo com Moore e leva-se na macacada Durão a afirmar que viu as provas das armas de destruição em massa no Iraque, coisa que nem Hans Blix viu. Deveríamos ter sido sisudos era com Durão Barroso.»