MINI-SAIA. A notícia do Correio da Manhã sobre a proibição da mini-saia numa escola de Colares é tudo menos um fait-divers. Há uma questão de fundo: a da liberdade, evidentemente. E há a medida tomada pelo director da escola: proibir (cito o Correio da Manhã) «mini-saia, calções, chinelos, decotes ou dizer palavrões». Jorge Bacelar Gouveia diz que «um regulamento deste tipo é inconstitucional», e eu admito que haja uma discussão a realizar – e admito que a interpretação esteja correcta. Seja, pois, inconstitucional.
Ilustremos com um caso norueguês: o de Grimstad, onde a direcção de uma escola resolveu mandar fabricar t-shirts para os seus alunos – em especial para as suas alunas, está bom de ver. São t-shirts largas, de algodão de boa qualidade, cor de laranja e que descem um pouco abaixo da cintura. As t-shirts de Grimstad visavam, antes de mais [dizia a direcção da escola], fazer com que os alunos «se concentrem principalmente nos ensinamentos do professor». A imprensa protestou: as t-shirts de Grimstad eram a “burqa” norueguesa. A Comissão para a Igualdade entre os Sexos também protestou e acusou os professores de Grimstad de fomentarem a discriminação. É um exagero, provavelmente. Mas compreendo que não se possa, com toda a honestidade, ensinar equações de segundo grau, falar sobre o teatro de Ibsen ou os primórdios da literatura norueguesa, com tanto umbigo à mostra. Sou, portanto, um censor? Não sei. Mas tenho uma dúvida: eu, que me regozijo com os umbigos, acho normal que um professor se sinta perturbado com as glândulas sobressaltadas de uma adolescente que recita Shakespeare (acho difícil, porque os clássicos são cada vez menos conhecidos na escola). Pretender anular a sexualidade onde ela está à mostra é um esforço hipócrita tão grande como pedir a alguém que se excite com um retrato da madre Teresa.
Há tempos, um jornal português fez campanha em defesa de um professor que ia para as aulas de t-shirt, calções e sandálias. Parece que alguém do ministério lhe teria mandado um recado (do género: «Ó homem, é melhor vestir coisa mais apropriada.») Ergueu-se um coro de protestos contra o ministério fascista – que um professor pode vestir-se como quiser. Os alunos chamaram um regalo ao uniforme do professor e colavam-lhe papéis nas costas.
Chegados a este ponto, não sei o que as pessoas pensam sobre a escola. É certo que seria ridículo vestir a rapaziada de sargentos da GNR, mas ter em cada adolescente uma Lara Croft (está bem, uma Eva Mendes) pode ser um impedimento para falar de Camões ou da química dos elementos. Se um homem tem estas dúvidas, é um padreca empedernido; se olha para os umbigos, é um tarado diabólico. Decidam-se.
Bacelar Gouveia (citado pelo Correio da Manhã)) acha que o regulamento disciplinar da escola de Colares «põe em causa a liberdade pessoal, a liberdade de apresentação». Eu também acho. Mas não me parece muito mal que isso aconteça numa escola.
A questão não está, sequer, em que se discuta se o regulamento é exagerado ou não. Mas este coro de críticas unânimes parece-me que requer discussão. A unanimidade geralmente é burra. E cega.
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