Revista de Blogs. O Casmurro comenta o final de uma época.
Já soube que alguém disse que a morte de Álvaro Cunhal é o fim de uma época?
— E daí, Groucho?
— Nenhuma surpresa, claro. Surpresa é não dizerem o mesmo da morte de Eugénio de Andrade. No caso de Cunhal, o lugar-comum implica contra-senso: há anos que lhe chamavam fóssil, anacrónico, dinossauro… Será que a época que acabou com ele é aquela em que os homens podiam sobreviver à própria época? A vida aquém-túmulo vai tornar-se insuportável para muita gente…
— Sempre especioso, carago. Mas por que raio haviam de dizer o mesmo do Eugénio de Andrade?
— Não é isso, senhor, não digo que devessem dizer. Registo apenas a diferença, essa sim, especiosa, que liquida ideias e ideais políticos para certificar o óbito das épocas que os originaram, enquanto pressupõe que os poetas e a poesia são de sempre, mais perenes que o monumento mais perene que o bronze de Horácio. Dir-se-ia que a época dos poetas nunca há-de chegar ao fim…
— Ao fim chegará, se já não chegou. O que não quer dizer que os poetas acabem…
— Sempre especioso, meu caro senhor, sempre especioso.
[Abel B. Baptista, no Casmurro]
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