CONSPIRAÇÃO. Sim, há a nossa indignação e o esbanjamento ético correspondente. A quantidade de virgens ofendidas e escandalizadas com o actual processo político é realmente cansativa, perorando sobre moral, abandonados que estamos, coisa vil que são os princípios. Já o sabíamos de há muito. Durão faltou às promessas -- à promessa de cumprir o mandato. Isso é de uma clareza mais do que lapidar. Mas, para lá de tudo isso, que nos fornece um capital de indignação muito para lá do suficiente, e da hipótese de Santana Lopes ir a primeiro-ministro, que nos preenche vários parágrafos entre a pilhéria e a apreensão, há uma realidade muito mais prática que também ocupa espaço: o que vai mesmo acontecer? Nessa matéria, confesso, suponho que Santana prefere eleições. É o seu campo aberto preferido, liberta-o da cumplicidade do presidente, da desconfiança do seu eleitorado, da artilharia da oposição. Por isso, sendo evidente para qualquer pessoa que a esquerda deve exigir eleições quanto antes (seria uma vergonha que o não fizesse), poderíamos especular sobre isso: eu acho que Santana prefere ir a eleições, caso seja designado presidente do PSD amanhã à noite. Pode perder, sim, arrastando consigo a vingança que lhe foi dedicada por Durão Barroso (deixar-lhe o partido e uma hipótese de governo); mas, em campanha, Santana estará como peixe na água, sacudindo do capote a «tralha barrosista» (o rigor orçamental, a ditadura das Finanças), fazendo as tropelias que entender, desafiando Ferro Rodrigues, nomeando adversários. Esse é um ponto.
Ele sabe que, se aceitar as exigências de Sampaio e dos «pilares do regime» (desde as regras de bom-comportameno orçamental até à ideia de morigeração geral), acabará o Santana Lopes como Santana Lopes gosta de vender Santana Lopes. Deixar que o Presidente lhe diga como deve ser tratada a economia, como deve falar sobre a Justiça ou sobre a iliteracia, sobre a «opção atlantista» (que tema!, que tema!) ou sobre os costumes em geral, parece-me que significa abdicar de coisas bastantes.